LinkGen

O DNA é a chave para a verificação da paternidade

Artigo publicado na edição 118/97 da Revista Quarto de Milha

O uso da tecnologia do DNA recombinante na pesquisa biológica constitui um recurso revolucionário. O DNA foi considerado, pela revista Time, como a Molécula do Ano. O Prêmio Nobel foi oferecido a um cientista pela invenção da técnica da reação em cadeia da polimerase (PCR), que amplia o DNA de modo a produzir uma quantidade que seja fácil de ser analisada. Os telespectadores tomaram conhecimento sobre o fingerprinting do DNA. A clonagem de um novo gene é, hoje, assunto de jornais.
O DNA (ácido desóxi-ribonucleico) está localizado no núcleo da célula e é a unidade básica da hereditariedade em muitos organismos, incluindo o homem e o cavalo. O DNA é composto de 4 moléculas básicas que aparecem em seqüências variáveis; estas moléculas são identificadas com as letras A, C, G, T. A seqüência na qual estas moléculas se situam em certos fragmentos do DNA é a chave para a verificação de paternidade. Para isto, utilizamos os chamados marcadores de DNA; regiões do DNA que podem ser comparadas entre indivíduos da mesma espécie e/ou entre diferentes espécies. Os microssatélites ou STRs (short tandem repeats ou pequenas repetições ao acaso) possuem estas características e foram escolhidos como marcadores preferenciais tanto no projeto genoma humano como no animal (cavalo, boi, cachorro, dentre outros). Estes marcadores são utilizados em vários laboratórios de pesquisa nos Estados Unidos, Suécia, Inglaterra, França, Holanda e Austrália e agora, em relação aos cavalos, no Brasil.
A LinkGen Biotecnologia Veterinária e Agropecuária, juntamente com o Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, desenvolveram um projeto nesta área, utilizando-se destes marcadores.

Utilização dos marcadores em testes de paternidade
Como estes marcadores podem auxiliar na determinação da paternidade?
Cada indivíduo tem seu próprio genótipo (conteúdo genético). Do mesmo modo que as impressões digitais, este genótipo é o único para este indivíduo, a não ser que tenha um irmão gêmeo univitelino. Estabelecer o genótipo (genotipagem) envolve a identificação de seqüências específicas em um fragmento de DNA. O fragmento não é necessariamente um gene inteiro ou mesmo parte deste gene; é somente uma determinada parte do DNA que foi cortado em pedaços no laboratório. Em um indivíduo, metade do conteúdo genético foi herdado do pai e outra metade da mãe. Assim, em cada região do DNA, chamada locus, o indivíduo possui dois dos chamados alelos, um proveniente do pai e outro da mãe. Suponha que, no locus n° 1, o garanhão tenha os alelos A e B (portanto, genótipo A/B) e a égua os alelos C e D (genótipo C/D). Os filhos ou filhas deste casal terão, então, o alelo A ou B (vindo do pai, com uma probabilidade igual) e o alelo C ou D (vindo da mãe). Então os filhos terão, obrigatoriamente, os genótipo A/C ou A/D ou B/C ou B/D.
Nos testes realizados pela LinkGen são examinados de 11 a 15 diferentes regiões do DNA, em fragmentos específicos. O que estas regiões têm em comum é a seqüência G-T repetida, sendo que o número de repetições é variável. Nós simplesmente verificamos quantas vezes a seqüência G-T se repete num locus em particular (lembremos que em cada locus há dois alelos). Como exemplo, veja a Figura 1.

Figura 1. Esquema de análise de um marcador. O produto tem genótipo A/B (variantes 19 e 12) e a égua o genótipo A/C (variantes 19 e 15). O garanhão 1 tem o genótipo B/D (variantes 12 e 14), não sendo excluído como pai. O garanhão 2 tem as variantes 14 e 10 (genótipo D/E), não presentes no produto, sendo excluído como pai.

Se num locus específico do filho avaliado encontramos G-T repetido 19 vezes em um alelo (variante 19, chamemos de alelo A) e também 12 vezes em outro alelo (variante 12, alelo B), sabemos que este animal (genótipo A/B) recebeu o alelo A de um dos pais e o alelo B de outro. Checamos em seguida o DNA da mãe e observamos, por exemplo, que ela tem a variante 15 (alelo C) e a variante 19 (alelo A). Portanto, ela passou o alelo A ao filho. Isto significa que o alelo B forçosamente é proveniente do pai. Checamos o garanhão 1 e observamos que ele tem a variante 12 (alelo B) e a variante 14 (alelo D); portanto, realmente, ele passou a variante 12 ao filho, o que revela que ele pode ser pai; se o garanhão tiver, por exemplo, as variantes 10 e 14 (garanhão 2), a análise revela que este animal não pode ser o pai, pois o indivíduo só pode transmitir à prole as seqüências que ocorrem no seu próprio DNA. A chance de 2 irmãos terem o mesmo genótipo, neste locus examinado, é de 1/4 ou 25%. Esta é uma porcentagem muito alta para os processos de identificação; por isto, outras regiões do DNA também são analisadas para se estabelecer a identidade do indivíduo. À medida que examinamos um número maior de regiões e as analisamos em conjunto, esta porcentagem vai diminuindo, até se tomar muito pequena. Deste modo, a possibilidade do resultado do teste ser proveniente de erro acidental ou derivado da ação intencional por parte do dono do animal é extremamente reduzida.

Análise da Exclusão
Após a análise dos fragmentos de DNA, examina-se a eficácia do teste (probabilidade de exclusão). A probabilidade de exclusão é a demonstração de que um indivíduo específico não pode ter contribuído com o material genético encontrado em outro indivíduo. Assim, quando um determinado cavalo ou égua não for o progenitor (garanhão 2 da figura), diz-se que houve uma exclusão. É importante salientar que tanto a genotipagem quanto qualquer outro teste de verificação de paternidade não vão, de maneira alguma, provar a paternidade; eles vão verificar se é ou não possível que um acasalamento específico tenha produzido um produto específico. Quanto mais poderoso for o teste para excluir uma identidade (incorreta), maior a probabilidade de exclusão. Em outras palavras, a probabilidade de exclusão pode ser tão alta que torna praticamente impossível que um outro animal, que não o pai real, possa ser apontado como progenitor. A tipagem sangüínea foi tremendamente efetiva na verificação da paternidade. O teste de DNA atualmente utilizado tem uma eficácia ainda maior, pois seu poder de resolução é superior; é como se fosse usado um microscópio mais poderoso. Como resultado, a genotipagem pode produzir uma exclusão que a tipagem sangüínea não pôde detectar. Por outro lado, se o parentesco de um animal foi excluído pela tipagem sangüínea, não há chance da genotipagem produzir um resultado diferente. É possível verificar o parentesco, através da genotipagem de cavalos, com exclusão de 99,91%. Isto significa que o teste de DNA em cavalos exclui um parentesco incorreto em 99,91% das vezes. Já em relação à tipagem sangüínea, a exclusão é da ordem de 96,5%. Portanto, o teste de DNA é muitas vezes mais efetivo que o teste sangüíneo convencional.

Significância do nível de exclusão para o criador
Para o criador de cavalos, a diferença acima citada pode parecer insignificante. Mas não é. Considere um exemplo já utilizado por outros. Imagine que, na Força Aérea, há treinamento de pára-quedistas. Por dia, são dados 2000 saltos com um determinado tipo de pára-quedas. Imagine que em 99,9999% dos saltos todos os pára-quedas se abrem sem problemas. Isto significa que uma vez em 1 milhão de saltos o pára-quedas não se abrirá, ou seja, uma vez em cada 500 dias. Mas, e se o pára-quedas se abrir em 99,9% dos saltos? Há diferença? São 99,9999% e 99,9% valores muito diferentes? Aparentemente não, mas isto significará que o pára-quedas não se abrirá uma vez a cada 1000 saltos, ou seja, duas vezes por dia.
Outros exemplos? Calcula-se que se, nos Estados Unidos, o Correio enviar adequadamente somente 99,9% das correspondências, isto significaria que 16.000 cartas deixariam de ser entregues a cada hora. Também nos Estados Unidos, 99,9% de eficiência na compensação de cheques correspondem a 20.000 cheques sendo debitados da conta errada, por hora.
Deste modo, observa-se o por quê da genotipagem ter uma eficácia (99,91%) muito maior que os 96,5%, em média, da tipagem sangüínea. Se analisarmos estas porcentagens em relação ao exemplo dos pára-quedas, significará que o pára-quedas "DNA" não se abriria quase duas vezes por dia, enquanto que o pára-quedas "tipagem" não se abriria 70 vezes por dia. É uma grande diferença, pelo menos para quem salta.

Amostras para análise
A retirada da amostra para a análise do DNA, no cavalo, é simples. Não há necessidade de retirar sangue evitando, portanto, problemas ocasionais com determinados animais; não é necessário refrigerar a amostra, nem enviá-la rapidamente ao laboratório de modo que a amostra chegue em tempo hábil para que hajam células suficientes para o teste de tipagem ser realizado em boas condições.
O exame é feito em pêlos. Deve-se puxar o pêlo da crina acima da cernelha (o pêlo da cernelha tende a ser muito fino para ser facilmente testado), e tomar cuidado para que saiam também os bulbos (raízes). Se o pêlo é puxado igualmente e diretamente para longe do pescoço, ele tenderá a sair pelas raízes, ao invés de quebrar. Quando se olha atentamente para a terminação do pêlo que estava no interior da pele, as raízes serão vistas, especialmente se uma lente de aumento for utilizada. Devem ser retirados cerca de 50 pêlos com o máximo de bulbos possível. Os pêlos da cauda podem também ser uma segunda opção. Os pêlos são colocados num revestimento adesivo, deixando as raízes soltas, preenche-se as informações referentes ao animal a ser genotipado, coloca-se num envelope, leva-se ao correio e envia-se à Associação.
O pêlo pode ser arquivado para repetições posteriores do exame. Não somente o pêlo é utilizado para a genotipagem. Sangue, pele ou osso também constituem excelente material. Mesmo amostras de autópsia preservadas em formaldeído ou armazenadas no freezer de um veterinário, que são inadequadas para tipagem completa, podem ser adequadas para a genotipagem.

Situação atual da genotipagem
A American Quarter Horse Association (AQHA) há muito tempo adotou a genotipagem, de forma gradual, da seguinte maneira:

  • Garanhões que cobriam 5 ou mais éguas, em 1994, foram genotipados, sendo que o número de éguas está sendo reduzido anualmente, até que em 1998 o número será 1. Assim, no próximo ano, todos garanhões expostos (por exposição entenda-se a tentativa de fazer uma égua procriar ou mesmo deixá-la ser coberta pelo garanhão) deverão ser genotipados. Uma vez que o garanhão esteja genotipado, não terá que ser resubmetido ao exame por um ano.
  • Todas as éguas que deram cria a partir de 1° de janeiro de 1995 têm sido obrigatoriamente genotipadas antes do registro de qualquer cria por elas produzida. Isto não significa que devem ser genotipadas no momento de seu próprio registro, mas sim antes de que a sua cria possa ser registrada.
  • No caso de cavalos de corrida, a genotipagem e verificação de paternidade foram requeridas para todas as crias nascidas após 1° de janeiro de 1992.
    A associação americana, portanto, está ativa no sentido de genotipar todos os animais o mais rápido possível. A ABQM também já está fazendo uso, em conjunto com a LinkGen, das mesmas técnicas sofisticadas acima descritas. Tendo em vista a globalização do planeta e, no caso em particular, da interação entre as associações de criadores, cremos ser esta a época certa para se lançar um tipo similar de programa no Brasil. Quanto mais tempo for adiada a introdução da genotipagem maior número de amostras vão ter que ser testadas no futuro, pois o teste de DNA é a técnica de escolha, mundialmente reconhecida.
    A grande maioria dos geneticistas e veterinários acredita que a adoção do teste de DNA para identificação e verificação de paternidade é inevitável, e a ABQM está demonstrando liderança ao utilizar este método de teste genético, que terá como resultado a maior integridade da linhagem, tornando mais confiantes todos os proprietários brasileiros de Quarto de Milha.

    Elaborado por: Sérgio Paulo Bydlowski / Jaime Leyton - LinkGen Biotecnologia Veterinária e Agropecuária S/C Ltda. ; José Fernando Garcia -Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo.

    © ABQM, Associação Brasileira dos Criadores de Cavalos Quarto de Milha


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